29 de junho de 2011

Coluna da Profa. Lilia Schwarcz no Jornal O Estado de S. Paulo: Ensaio polêmico sobre os escravos

Fugiu Diogo, de nação Calabar, falta de cabelo no alto da cabeça e um joelho mais grosso que outro, resultado de castigos. Fugiu Benedito, crioulo, oficial de carpina, já velho e desdentado, com cabelos brancos na cabeça. Fugiu João, de nação Angola, uns 20 anos, cego do olho esquerdo e traz cicatrizes sobre o corpo. Fugiu Catarina, de nação Congo, cozinheira, traz marcas de pegas e ganchos. Fugiu o preto José, por alcunha Caboclo, de nação Gabão, magro, feio de feições, zambo das pernas e na esquerda tem grande cicatriz que nunca sara.

Os jornais brasileiros do XIX estão repletos de anúncios como esses, que noticiam fugas de escravos. Sem distinção de sexo ou idade, tais documentos -- que de quando em quando traziam a imagem de um homem negro, carregando uma trouxa nas costas e sempre descalço (símbolo maior de sua condição escrava) – representam prova substantiva de como o cativeiro foi naturalizado no Brasil, e da maneira como a violência do sistema não assustava; ao contrário, era utilizada como forma de identificação.

E não foram apenas os anúncios de fuga que escancararam a presença escrava no país. Se neles pretendia-se descrever objetivamente o “cativo fujão”, de maneira a ajudar na recuperação; já nas inúmeras notícias de aluguel, venda, penhora ou seguro de escravos, a operação dava-se ao revés: tratava-se de exaltar as qualidades do “produto”, descrito como fiel, limpo e sem vícios; tais como comer terra, fumar tabaco, maconha, ou entregar-se à cachaça. Como se os vícios fossem da natureza, e não consequência do próprio sistema!

O fato é que nesses pequenos anúncios podem ser encontradas grandes pistas para entender como a escravidão mercantil transformou humanos em “coisas”, “bens semoventes”. E é em torno desse material que o antropólogo Gilberto Freyre se debruçou nos anos 1930. Conhecido pela originalidade de suas pesquisas, Freyre mais usou dos documentos do que os analisou com vagar. Afinal, não por acaso o intérprete introduziu o subtítulo: “tentativa de interpretação antropológica”. Esse era seu método: levantar, descrever, e transformar casos isolados em modelos ilustrativos.

E os anúncios afirmaram-se como fontes destacadas na obra do autor. A documentação lhe serviu de pista para o levantamento das diferentes procedências dos africanos e comprovação da variedade de profissões. Além do mais, o material mostrou-se apropriado para entender que se escrevia assim da maneira como se falava: “português brasileiramente”. Por fim, por meio deles era possível prever os usos do corpo escravo, de parte a parte: com as tatuagens o cativo marcava sua origem, para que ninguém a contestasse; já o senhor usava do mesmo recurso para gravar em brasa sua propriedade. Como se vê, destinos diferentes se escreviam no mesmo corpo.

Conforme mostra Alberto da Costa e Silva, em excelente prefácio para o livro O escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX, recentemente reeditado, a obra nasceu de um artigo publicado na revista “Lanterna verde” em 1934, o qual resultara, por sua vez, de uma palestra de Freyre sobre o tema. Como no pensamento do antropólogo um texto puxa outro, logo viria nova conferência – sobre deformações nos corpos dos escravos fugidos – e mais outro ensaio. O livro mesmo só sairia em 1968, sem perder, porém, seu pioneirismo.

Se os anúncios já haviam sido utilizados em obras como O abolicionismo, de Joaquim Nabuco, jamais ganharam tratamento sistemático. Talvez por isso o livro de Freyre ainda cause espanto. Nele, vemos o desfile de diferentes tipos de escravos. Aí estão as descrições de escravos altivos, com rostos belos, quase esculpidos, corpos atléticos e peles a brilhar. Já as africanas mais parecem musas de ébano, com seus penteados exóticos, panos coloridos e corpos de “Vênus”. Mas que não se esqueça do outro lado: são inúmeros os cativos descritos como gagos, mancos, queimados, desdentados, feridos e por aí vamos.

Ao final do livro, ainda temos a chance de acompanhar Freyre se exercitando com imagens: ele comenta feições, adivinha desejos, testa aspirações. Mestre nos detalhes, o antropólogo não deixava nada escapar. Cada sinal se converte em pista; cada pequeno elemento tem a capacidade de iluminar vastas estruturas.

Pena é que, mesmo diante de documento tão expressivo, Freyre insista no caráter benigno da nossa escravidão. Nos prefácios que fez à obra, tendeu a obliterar o modelo ambivalente que apresentou anteriormente, em livros como Casa Grande & Senzala ou Sobrados & Mucambos, quando o “&” mostrava como a realidade era mesmo ambivalente e avessa a verdades certeiras. Se no âmbito doméstico a escravidão nos legou a mestiçagem biológica e cultural, já como sistema -- que previa a posse de um homem por outro --, não há como imaginar modelo mais violento. Aí estão os anúncios que não permitem cegueira fácil ou esquecimento seletivo.

27 de junho de 2011

Numas Recomenda: Qualificação

EXAME DE QUALIFICAÇÃO DE MESTRADO

Na rua, na praça, na boate: uma etnografia do circuito GLS e dos momentos de sociabilidade pública de Belém-PA.

DISCENTE: Mílton Ribeiro da Silva Filho.

Banca Examinadora:

Profa. Dra. Carmem Izabel Rodrigues – IFCH/PPGCS (Orientadora)

Profa. Dra. Diana Antonaz – IFCH/PPGCS (Examinadora)

Profa. Dra. Mônica Prates Conrado – IFCH/PPGCS (Examinadora)

Prof. Ph.D. Samuel P. L. Veissière – University College of the North/Canadá (Examinador)

Data: 29/06/2010 às 14h.

Local: Sala de Audiovisual do Laboratório de Antropologia.


17 de junho de 2011

Numas Recomenda: Sessão Temática


Maiores informações sobre o evento - programação e inscrições - no site: http://www.mp.ba.gov.br/eventos/2011/junho/dia_20/dia_20.html

Artigo: A sentença de morte que transformou minha vida

A sentença de morte que transformou minha vida
Portar HIV já significou ter hora marcada para morrer, mas essa agenda mudou 13 de junho de 2011


Mark Trautwein, do The New York Times - O Estado de S.Paulo

Não morri com hora marcada.

Muitas pessoas não acreditam que a morte tenha uma data, ao menos uma que seja conhecida. Mas se você foi infectado com o vírus da aids no início da epidemia, pensou diferentemente. Aos 61 anos, vivi metade da vida com aids, minha companheira constante e prima distante, inseparável identidade que não permito me definir, fato cotidiano e situação especial que mudou minha vida sob todos os aspectos.

Embora não houvesse na época testes para detectar a doença, creio que a contraí em 1982. Hoje é difícil imaginar a liberação sexual que tomou conta dos gays naquele tempo. Era o fim da opressão. Tínhamos liberdade e afirmávamos isso com sexo.

Mas, depois de um encontro com um famoso ator que ocultava sua homossexualidade, um enorme hematoma apareceu no meu braço. Em seguida, fui hospitalizado com um problema sanguíneo sem explicação aparente. Os médicos aturdidos pensaram muito sobre o caso, perguntaram se eu tinha bebido gim com tônica. Disse-lhes que era a bebida do meu pai. Sem tantos absurdos, o problema também vinha ocorrendo com gays em Nova York. O termo "praga gay" estava no ar, mas ninguém sabia o que era nem como a pessoa era infectada. A aids parecia muito aleatória, aniquilando estranhos e conhecidos; mas, você sempre se dizia que a doença estava distante. Então, de repente, ela já não estava mais distante de mim, absolutamente.

Deixei o hospital certo de que tinha contraído o vírus. [...]

link para artigo completo

2 de junho de 2011

Inscrições abertas: II Seminário Enlaçando Sexualidades

Inscrições abertas para o II Seminário Enlaçando Sexualidades

SES 2011.jpg

De 04 a 06 de setembro de 2011, no Centro de Convenções da Bahia, o Núcleo de Estudos de Gênero e Sexualidades Diadorim/UNEB em conjunto com o Doutorado Multi-institucional e Multidisciplinar em Difusão do Conhecimento e o Programa de Pós Graduação em Crítica Cultural (UNEB) realizam o II Seminário Enlaçando Sexualidades.

Neste ano, os eixos temáticos giram em torno das áreas de Direito, Relações Etnorraciais, Educação, Trabalho, Reprodução, Diversidade Sexual, Comunicação e Cultura.

O Enlaçando Sexualidades está com as inscrições abertas e busca reunir pesquisador@s, professor@s, estudantes universitári@s, integrantes dos movimentos sociais, que discutam sobre a(s) sexualidade(s) transversalizando-a com as diferentes áreas do saber.

Para mais informações, acesse o site www.ses2011.uneb.br!

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II SEMINÁRIO ENLAÇANDO SEXUALIDADES
Direito, Relações Etnorraciais, Educação, Trabalho, Reprodução, Diversidade Sexual, Comunicação e Cultura
4 a 6 de Setembro de 2011


Chamada para publicação de artigos

INVITACIÓN A PRESENTAR ARTÍCULOS / CALL FOR PAPERS
ÍCONOS es la revista especializada en ciencias sociales de la Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales Sede Ecuador. Fue fundada en 1997 y su objetivo es estimular un tipo de reflexión que vincule las inquietudes académicas de las ciencias sociales con problemas de la realidad social. La revista está dirigida a la comunidad científica y a quienes se interesen por conocer, ampliar y profundizar, desde perspectivas académicas, temas de debate social, político, cultural y económico del país, la región andina y América Latina en general. Íconos se publica tres veces al año en los meses de enero, mayo y septiembre.
Dossier: Antropología visual en Latinoamérica
Coordinación: Xavier Andrade y Gabriela Zamorano
Entrega de artículos hasta: 12 de agosto de 2011
Publicación: enero 2012
Envío de artículos: revistaiconos@flacso.org.ec
Pese a ser una subdisciplina de larga data, la Antropología Visual es un campo emergente en la región. Programas de formación de postgrado han surgido en Ecuador, Brasil, Chile y Perú en los años más recientes, y en otros lugares, como México, Argentina y Colombia -pese a una larga tradición de producción documental en fotografía y cine, incluyendo cine etnográfico- las discusiones sobre visualidad ocupan un espectro más amplio, a veces subsumidos en discusiones multidisciplinarias. El propósito de este primer dossier sobre la materia en la región es brindar un estado de la discusión sobre las prácticas académicas dirigidas a la constitución de un campo de debate como tal, el diálogo y el conflicto entre la producción textual y audiovisual, los problemas pedagógicos en la enseñanza de la etnografía visual y el avance en agendas relacionadas con la representación de el Otro. En resumen, se busca identificar exploraciones teóricas o metodológicas para el análisis y producción de visualidades en la región desde la antropología. Adicionalmente, interesa el territorio de diálogo en construcción entre la antropología y el arte contemporáneo.

El dossier se propone como una oportunidad para repensar:
1. La posición de la antropología dentro del debate más amplio de estudios de la visualidad.
2. El diálogo y las tensiones entre la producción de textos de investigación y productos audiovisuales informados por “la mirada etnográfica”.
3. Relación entre cine, documental, documental etnográfico, memoria y antropología.
Los artículos deberán ajustarse a la Política Editorial y a las Normas de Publicación (disponibles enwww.flacso.org.ec/html/iconos.html). Para la selección de artículos se utiliza un sistema de evaluación por lectores pares (peer review).
Idiomas: se receptarán propuestas en español, inglés o portugués.
Antes de esa fecha, se pueden contactar con la revista para aclarar dudas y perfilar propuestas.

1 de junho de 2011

Disponível na Web - Culture, HIV and AIDS

Please find below an annotated bibliography on Culture, HIV and AIDS produced by UNESCO.

Table of Contents
Introduction 4
Part I: Culture and everyday life: micro and macro approaches
A. Power and everyday life
1. Gender roles and power relations 6
2. Sexual violence and exploitation 11
3. Sexuality and constructions of identity 15
4. Demographic issues and reproductive health implications 19
a. Migration 21
b. Orphans and vulnerable children 26
B. Systems of Thought
1. Communities of worship 31
2. Explanatory systems and bodily practices 34
3. Healing systems 41
Part II: The response to the epidemic: cultures of prevention and care
A. Biomedical responses, impacts and uptake 44
B. Behavioral approaches 48
C. Human rights based approaches 57
D. Prevention and education 60
E. Health Systems and Policy 65
F. Civil Society 68
G. Governance, development and political economy 72
H. Security 77
Part III: Literatura Española 80
Part IV: Littérature Française 90